sexta-feira, 11 de dezembro de 2015

O dever e o direito à educação

O Artigo 205 da Constituição Federal de 1988 reza que a educação é “direito de todos e dever do Estado”.  Analisando cuidadosamente a questão, podemos fazer uma reflexão sobre o significado de “direito” e “dever”, para concluir que talvez o tema não seja assim tão simples de ser abordado, pois quando falamos em “direito” fica impossível não fazer vinculo com algo que seja necessário e encarado como prioridade na vida de quem o procura. Cabe lembrar que ninguém procura direitos pelos quais não tem interesse. Com o direito, também se associa o conceito da liberdade de não usufrui-lo.
Cabem então as perguntas: seria a educação encarada como uma prioridade ou uma necessidade na vida do brasileiro?  Teria o brasileiro à liberdade de não se educar em uma escola se assim for o seu desejo?  O Estado tem cumprido o seu “dever” de fornecer o “direito” à educação para todos?
Não é preciso investigar muito a fundo para constatar que para quase a totalidade da população, a educação não é uma prioridade. Basta para isso observar três minutos de uma aula da quinta série, por exemplo. E a julgar pelos relatos de muitos professores do ensino superior, a situação não se limita aos pequenos. A culpa, é claro, não pode ser imputada somente aos estudantes. A curiosidade e o desejo de aprender é uma característica humana. Basta observar o comportamento das crianças em seus primeiros anos de vida para constatar isso. É um fato sociológico que o homem é fruto do seu ambiente, de maneira que dificilmente um indivíduo manterá sua disposição inata para o aprendizado em um meio onde a sociedade e, de um modo mais específico, a mídia enaltece outros valores. A paixão pelo aprendizado tende a arrefecer.
Muito menos a culpa pode ser lançada sobre os professores ou sobre os métodos. Professores e métodos são apenas instrumentos do aprendizado. Em educação, o sujeito ativo é o aluno.  Um bom professor e um bom método ajudam, mas de longe não podem ser o mais importante, de maneira que o fracasso no aprendizado não deve ser de responsabilidade exclusiva deles. Alinhem-se os interesses da sociedade com o trabalho da escola e os resultados serão bem melhores.
Na ânsia de se fazer entender a alunos que não julgam a educação uma prioridade, a escola vem cada vez mais empobrecendo a sua linguagem. Como resultado o Brasil veem ocupando os últimos lugares nas listas mundiais de educação. Some-se a isso a destruição de consciências que se faz com uma educação criadora de ativistas, ao invés de indivíduos realmente pensantes e está completa a calamidade.
Como a educação é um direito de todos, teria um pai à opção de não matricular seu filho em um sistema obviamente falido e educa-lo em casa? Este mesmo pai teria, também, a opção de não pagar a parte dos impostos destinados a este fim? Obviamente que não. Logo, a educação não pode ser um direito de todos, pois é contraditório punir o beneficiário por não querer usufruir de seu “direito”.  Ou a educação é um direito no qual existe a opção de não usufrui-lo, ou é um dever de todos onde cabem ações legais para quem não o cumpre. Não é preciso um diploma universitário para compreender isso.
Se a educação é direito de todos alguém deve ter o dever de proporciona-lo, isto, segundo se acredita, cabe ao Estado. É obvio, por uma questão de logística que o Estado não tem condições de atender toda a população de um país de dimensões continentais. A escola que funciona, deveria ensinar que entre aquilo que se escreve e a realidade como se apresenta existe uma gigantesca distância.

terça-feira, 8 de dezembro de 2015

TEORIA DA AFETIVIDADE DE WALLON: CONTRIBUIÇÕES PARA A MELHORIA DA RELAÇÃO PROFESSOR-ALUNO

1 INTRODUÇÃO
A fundamental importância da educação nos primeiros anos de vida é consenso entre psicólogos e psicopedagogos. Em virtude disto torna-se razoável concluir que uma base ruim nestes primeiros passos, irá prejudicar todo o andamento dos estágios subsequentes. Se em seus primeiros momentos na escola, a criança não compreender o valor da disciplina, da concentração, do foco, da persistência, do trabalho em grupo, do respeito a si próprio e aos demais, é certo que ela terá muitas dificuldades em sua futura vida escolar.
O objetivo deste trabalho de pesquisa é fornecer suporte aos profissionais do CEI - Centro de Educação Infantil “Nosso Lar” para a turma de 4-5 anos. Esta pesquisa justifica-se devido à constatação de inúmeras dificuldades no relacionamento professor-aluno. Justifica-se, ainda, com a constatação da influencia do fator emocional para o bom desempenho dos alunos em sala, pois compreendemos que o professor por meio de seu estado emocional, é capaz de influenciar a emotividade de toda uma sala.
Diante desta realidade nossa pesquisa irá focar no trabalho de Henri Wallon (1879-1962), filósofo, médico, psicólogo e político francês, cujo trabalho se ateve em grande parte aos caminhos que transformam a emotividade em intelecto. Todavia, no intuito de reforçar as ideias aqui expostas, iremos nos apoiar em outros autores, como Jorge La Rosa e Geoges Synders.
Esta pesquisa será também relevante para trabalho do psicopedagogo na medida em que ele oferecer apoio aos profissionais em sala de aula, promovendo uma reflexão que considere a criança de forma integral: emoção e inteligência.
Neste trabalho tivemos a oportunidade por meio da pesquisa de campo, de coletar dados que nos colocaram a par das dificuldades sentidas pelos profissionais do CEI “Nosso Lar”.
Acompanhando os trabalhos realizados dentro da sala e aula, ouvindo os depoimentos dos profissionais e analisando as respostas das questões chave[1], procuramos entender as situações do ponto de vista do trabalho de Henri Wallon. Assim sendo, esperamos construir nesta pesquisa um pensamento voltado para a melhoria das práticas docentes e das relações afetivas entre aluno-aluno, entre professor-aluno e entre aluno-professor.

2  AFETIVIDADE, INTELIGÊNCIA E MOTIVAÇÃO.

 O ato de educar ultrapassa o simples processo de transmissão de informações: ninguém aprende somente por meio de palavras, mas por um conjunto de elementos que interagem e se complementam.
Para Skinner, por exemplo, os estímulos do meio em que o indivíduo vive são determinantes para a aprendizagem (Ries, 2003, pág. 59).
Albert Bandura ( 1925- ) defende que  a figura do professor,  antes de tudo, funciona como um modelo de comportamento que os alunos seguirão (La Rosa, 2003, pág. 79).
Já para Carl Rogers o processo de aprendizagem é uma responsabilidade que deve ser compartilhada entre alunos e professores (Ferreira, 2003, pág. 153)
Desta forma o profissional da educação que deseja estimular o aluno de forma plena e fortalecer o processo de aprendizagem deve levar em consideração os vários elementos que produzem a ação. 
Um destes elementos é o estado emocional que dentro de uma sala de aula pode influenciar positiva ou negativamente o andamento das atividades. No trabalho de Henri Wallon as emoções possuem um valor preponderante, pois é através delas que a criança faz os seus primeiros contatos com o meio ambiente (Gratiot-Alfandéry, 2010, pág. 35).
É sabido que o estado emocional possui uma característica contagiante[2]. Dentro da sala de aula este estado emocional que se propaga, pode ajudar ou atrapalhar as atividades. Um professor apaixonado pelo tema da aula, que consegue expressar essa paixão com suas atitudes tende a contagiar seus alunos com o mesmo sentimento. Segundo Wallon:

O contágio das emoções é um fato já muitas vezes assinalado. Decorre de seu poder expressivo, sobre o qual se fundaram as primeiras cooperações de tipo gregário, e que incessantes intercâmbios e, sem dúvida, ritos coletivos transformaram de meios naturais em mímicas mais ou menos convencionais. ( 2007, pg. 71)

De igual maneira o estado emocional dos alunos pode exercer influencia sobre o professor.
Outros autores corroboram com a opinião de Wallon acerca da relevância das emoções na construção do intelecto. Snyders (1998), por exemplo, deixa claro que o amor ao mundo gera satisfação pelo conhecimento. Para Goleman, os alunos se tornam mais aptos para a aprendizagem à medida que desenvolvem prazer pelo o que está sendo ensinado.
Fica fácil inferir que as emoções possuem propriedades de motivação no processo de aprendizagem. Sobre motivação, Leda Raach (1999, pág.2) coloca que :

Tudo aquilo que move uma pessoa ou que a põe em ação ou a faz mudar o curso. Ela pode ser entendida como um fator psicológico ou como um processo. Atualmente a palavra motivação assumiu uma nova conotação, principalmente no que se refere às metas pessoais.


É certo que um professor pode motivar ou desmotivar seus alunos mediante as atitudes que ele assume diante da sala. Sem dúvida o método é importante, todavia não é determinante, pois cabe a sociedade como um todo produzir valores que despertem nos estudantes os sentimentos que darão impulso ao ato de aprender, como afirma La Rosa:






A tendência para a competência é universal. O desenvolvimento da motivação para a competência é aprendido e passa pela mediação da cultura, da família, dos meios de comunicação, da escola... (2003, pág. 175).


Responsabilizar somente a escola pelo fracasso educativo é omitir a responsabilidade de todos os seguimentos da sociedade. É condenar os estudantes a uma vida escolar de pouca ou nenhuma relevância, pois neste contexto o ambiente escolar vira um objeto estranho no organismo, um universo paralelo que perde todo o significado na vida do aluno, ao soar o sinal da saída.
Trabalhar a afetividade na criança em idade escolar requer a compreensão de que a ela, a criança, é um todo. Não adianta trabalhar somente em um aspecto e esquecer-se dos demais, como assinala Wallon (2007, pág.102): “É contrário à natureza tratar a criança fragmentariamente. Em cada idade, ela é um todo indissociável e original”.
A compreensão de que a afetividade é indissociável da inteligência, no trabalho de Wallon é a chave para uma pratica educativa eficiente. Uma pratica educativa focada no desenvolvimento da criança como um todo indissociável, requer a compreensão de como movimento, afetividade e cognição interagem no processo de evolução do ser humano.

                                               
  
3  REFERENCIAL TEÓRICO

Um dos eixos do trabalho de Henri Wallon é a integração entre movimentos, afetividade e inteligência. Essa integração, de acordo com Wallon não segue uma ordem definida, com a necessidade do pleno desenvolvimento de um para que o outro se manifeste, mas se dão em fases onde um elemento se sobrepõe a outro em um revezamento que se alterna de tempos em tempos:

Para quem olha cada um em sua totalidade, a sucessão deles parece descontínua; a passagem de um para o outro não é uma simples amplificação, mas um remanejamento; atividades preponderantes no primeiro são aparentemente reduzidas ou às vezes suprimidas no seguinte. (2007, pág.47)


Através de suas pesquisas sobre o desenvolvimento da consciência, Wallon pôde observar os papéis desempenhados pelos movimentos e pela afetividade para a formação do intelecto.
Nos primeiros dias de vida quando a criança ainda não consegue distinguir[3] o mundo exterior de seu próprio ser, os movimentos involuntários do bebê desencadeiam os processos que irão, futuramente, criar o vínculo afetivo com as pessoas.
Hélène Gratiot-Alfandéry, em sua obra sobre a vida e a obra de Henri Wallon, (2007, pág. 35) destaca que: “Os movimentos do bebê, de início, são caóticos, mas as relações que estabelece, gradualmente permitem que a criança passe da desordem gestual às emoções diferenciadas”.
As conclusões de Walon permite aos professores uma reflexão sobre o papel dos movimentos e da afetividade como parte integrante do processo de aprendizagem. Métodos como dinâmicas de grupo aplicadas em sala de aula vêm corroborando com as ideias do estudioso francês.
Outros autores também tem se dedicado ao estudo da relação entre movimento, afetividade e inteligência.
Ladislau Dowbor, por exemplo, ressalta que o aprendizado integral envolve outros componentes que não apenas a aquisição de conteúdos:

As informações podem ser adquiridas por diversos meios e formas passando assim a ser fundamenta a não valorização apenas de aquisição de conhecimento, mas sim o desenvolvimento cognitivo e motriz dos alunos. (1996, pág.08)


Sánchez (1996) destaca a importância de se trabalhar a afetividade e o movimento em crianças com dificuldades cognitivas. Conclui-se com isso, a existência de uma concordância referente à preponderância na integração movimento-afetividade-intelecto para o desenvolvimento humano.
Para o trabalho do psicopedagogo, produzir situações em que a criança desenvolva suas habilidades interpessoais envolve a utilização de brincadeiras e aprendizagens de forma interdisciplinar. Matos Piva, sobre este assunto, explana:

Neste processo, a educação baseada na afetividade, motivação e dentro de princípios pedagógicos corretos, poderá auxiliar o desenvolvimento das capacidades de apropriação do conhecimento das potencialidades, corporeidades afetivas, emocionais, estéticas e éticas na perspectiva de contribuir para a formação de crianças felizes, capazes de desenvolver atividades relativas ao corpo, à sensibilidade, à imaginação, como música, expressão corporal, poesia, desenho e trabalho manual. (2010, pág.07)


Hoje, o importante papel que desempenha a afetividade na construção do intelecto possui grande gama de pesquisas que a confirma. Por isso, o Parâmetro Curricular Nacional (1997) destaca o valor da afetividade enquanto elemento que possibilita a interação com o ambiente, bem como a motivação necessária para o ato do aprendizado.
A Lei de Diretrizes e Bases da educação nacional deixa subscrito em seu artigo 2, a necessidade de uma educação que se preocupe com o desenvolvimento dos valores afetivos:

A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. (BRASIL, 1996)

As conclusões do trabalho de Walon no que tange ao papel da afetividade na formação do intelecto, portanto, possui variedade de confirmações, possibilitando a construção do referencial teórico necessário.


4. METODOLOGIA

Para este trabalho realizamos uma pesquisa do tipo estudo de caso, que consiste em obter conhecimento do assunto estudado por meio da análise de um único caso.
As ferramentas de coleta de dados que utilizamos para esta pesquisa foram as entrevistas, os questionários e a observação “in loco”.
Quanto ao estudo de caso, Magda Maria Ventura coloca que:

[...] entendido como uma metodologia ou como a escolha de um objeto de estudo definido pelo interesse em casos individuais. Visa à investigação de um caso específico, bem delimitado, contextualizado em tempo e lugar para que se possa realizar uma busca circunstanciada de informações. (2007, pág. 384)

Como ferramenta de coleta de dados a entrevista é, nas palavras de Oliveira, “o coração da pesquisa qualitativa” (2010, pág. 27), por meio da qual se pode coletar uma diversidade de dados, capaz de proporcionar uma satisfatória coleta de informações.
 O questionário enquanto ferramenta para coletas de dados consiste em um instrumento desenvolvido cientificamente, sendo composto de questões que obedecem a um critério estabelecido previamente. Deve ser respondido sem a presença do entrevistador (LAKATOS, 1999, apud MOYSÉS, MOORI, 2007, pág. 02)
Quanto à observação “in loco” trata-se de uma ferramenta de coleta de dados, capaz de fornecer várias informações ao pesquisador, já que se baseia no uso dos cinco sentidos humanos (OLIVEIRA, 2010, pág. 23)
O estudo foi realizado com participação de uma professora do CEI - Centro de Educação Infantil “Nosso Lar”, por meio da coleta de dados que foi feita com uma entrevista contendo perguntas que visam coletar informações sobre como a professora trabalha e entende o fator afetividade na sala de aula.
Foi também proposta para a mesma profissional, um questionário objetivando coletar informações de como a questão da afetividade foi tratada durante a formação profissional.
A observação “in loco”, no qual tivemos a oportunidade de acompanhar a atividade docente, nos revelou quais as dificuldades enfrentadas na relação professor-aluno. Nesta fase pudemos também observar a forma como o estado emocional dos alunos consegue influenciar o comportamento da sala de aula como um todo.



5ª  ANALISANDO OS DADOS COLETADOS

A pesquisa foi realizada na CEI - Centro de Educação Infantil “Nosso Lar”, localizado no bairro Padre Duilio, cidade de Juína, Mato Grosso, que atende crianças na fase da Creche e Pré-escola.  Todas as ferramentas usadas para a coleta de dados nesta pesquisa, a entrevista, o questionário e a observação in loco, focaram nas relações afetivas, construtoras de relações e base para o desenvolvimento do intelecto.
No PPP do CEI - Centro de Educação Infantil “Nosso Lar”, o papel da afetividade na formação do ser humano é evidenciado com as seguintes palavras:

“[...] considerando as especificidades afetivas, emocionais, sociais e cognitivas das crianças de zero a seis anos, a qualidade das experiências oferecidas no CEI, “Nosso Lar”, que podem contribuir para o exercício da cidadania [...]”.  (CEI, 2012, pag. 01)

Sendo assim, as referidas ferramentas para coleta de dados terão como objetivo o fornecimento de amostras de como as atividades dentro da sala favorecem o desenvolvimento de laços afetivos.
Na entrevista procuramos manter o foco na questão de como a afetividade é trabalhada dentro da sala de aula. Para isso entrevistamos a professora do CEI - Centro de Educação Infantil “Nosso Lar”, Maria Aparecida Dias, que é formada em psicopedagogia e atua como professora a mais de 18 anos.  Em sua turma do Pré I a professora destaca as leituras e as histórias como essenciais para o trabalho com a afetividade dos alunos em sala de aula. Destaca ainda que costuma utilizar histórias[4] que transmitam valores como respeito às diferenças.
Para a professora este tipo de trabalho que foca na questão da afetividade é essencial, pois na medida em que os laços afetivos são qualitativos o aprendizado se torna uma consequência. Contudo, a professora admite que nem sempre consegue direcionar a questão emocional de seus alunos, a ponto de permitir um processo mais eficaz de aprendizagem.
O questionário proposto para a mesma professora procurou verificar como a questão da afetividade influencia na pratica docente dos profissionais, partindo do pressuposto de que a forma como esta é conduzida nos anos iniciais de vida da pessoa, determina as ações futuras do indivíduo, conforme explica Wallon:





É inevitável que as influências afetivas que rodeiam a criança desde o berço tenham sobre sua evolução mental uma ação determinante. Não porque criam peça por peça suas atitudes e seus modos de sentir, mas precisamente, ao contrário, porque se dirigem, à medida que ela desperta, a automatismos que o desenvolvimento espontâneo das estruturas nervosas contém em potência, e, por intermédio deles, a reações de ordem íntima e fundamental. (2007, pág. 71)

De acordo com as respostas da professora Maria Aparecida Dias, do CEI - Centro de Educação Infantil “Nosso Lar” ao nosso questionário, a questão da afetividade foram trabalhadas em todo o seu período escolar com abordagens que englobaram a vida familiar e relacionamentos com os demais colegas. Contudo, a professora nos informa que nem sempre suas emoções foram respeitadas, mas não considera que esta experiência influencia da sua prática docente. O questionário respondido pela professora também nos informa que durante a sua formação acadêmica, a importância da afetividade foi trabalhada com certa ênfase. Porém, a professora pondera que nem sempre consegue lidar corretamente com a questão emocional em sua atividade docente. Houve ocasiões, segundo a professora, em que o estado emocional da turma se provou um obstáculo a ser superado.
A turma observada foi a do Pré I. Seguindo seu planejamento semanal, a professora inicia a sua aula com uma roda de conversa. Os alunos expressam livremente as suas ideias, o que proporciona uma boa socialização entre eles e a professora. Seguindo o planejamento e com o apoio do livro didático, a professora faz uso de brinquedos pedagógicos, livros infantis e fantoches. Percebe-se no relacionamento entre professor e alunos uma troca de carinho e afeto. Em sua fala, a professora demonstra uma linguagem acessível à criança e muita segurança. Em situações inusitadas, a professora demonstrou firmeza mantendo a disciplina sem a necessidade de agressões.
Destacaram-se também nesta observação as atividades propostas pela professora, que priorizaram o respeito, a paciência e a socialização, onde cada criança esperava a sua vez para usar os brinquedos.
Observou-se que com a formação laços afetivos entre professora e alunos, o ato de corrigir um comportamento prejudicial é mais bem aceito pela criança. É o respeito e a consideração que tornam o ambiente na sala de aula, propício para a aprendizagem.




6.  PROPOSTAS PARA A SOLUÇÃO DE PROBLEMAS

Uma abordagem pedagógica marcada pela ausência de laços afetivos entre professor e aluno, resulta em uma educação que se limita a um único aspecto do ser humano. É uma abordagem que não vê a criança de forma integral e não entende a atuação da afetividade como a primeira forma de comunicação entre o ser e o meio que o cerca, segundo aponta Wallon:

 As emoções consistem essencialmente a certo tipo de situação. Atitudes e situação correspondente se implicam mutuamente, constituindo uma maneira global de reagir e que é de tipo arcaico e frequente na criança. (2007, pág.70)


No trabalho de Wallon a afetividade se relaciona intimamente com os reflexos motores, mas sem que exista uma ordem definida de atuação sobre o indivíduo. Na criança hora existe a primazia dos reflexos motores sobre os impulsos afetivos, em outros momentos, percebe-se a afetividade direcionando os reflexos motores.
Nos estágios iniciais da vida essa relação é imperceptível, como aponta Wallon:

Ao espasmo está ligado o choro, mas também um conjunto de condições e de impressões simultâneas que se exprimem no espasmo bem como no choro. Nesse estágio elementar, não se pode evidentemente pensar em distinguir o sinal da causa. (2007, pág. 67)


Em sala de aula uma da maneira de explorar beneficamente essa relação entre atividades motoras e afetividade são as brincadeiras compartilhadas.
Outros autores têm atestado os benefícios dos trabalhos psicomotores para a construção das habilidades cognitivas das crianças, Santos salienta que:

A educação psicomotora contribui para o processo de aprendizagem do educando, propiciando um enriquecimento cognitivo, preparando-o para diversas habilidades através de atividades de movimento. (2014, pág. 1)

Em detrimento de uma prática docente que limita os movimentos do aluno, a atividade que privilegia o papel dos movimentos para a construção do intelecto encara o indivíduo em sua totalidade e desenvolve a afetividade, abrindo o caminho para um processo de aprendizagem mais efetivo.
A roda de conversa é um método bastante eficaz uma vez que permite à criança se expressar livremente. A linguagem na concepção de Wallon possui vínculo no desenvolvimento da afetividade e do intelecto, pois a criança na medida em que cria  vínculos afetivos vai ampliando a linguagem por imitação:

A aquisição da linguagem, por exemplo, não passa de um longo ajuste imitativo de movimentos e sequências de movimentos ao modelo que, já faz algum tempo, permite que a criança entenda algo do que dizem os que a rodeiam. (2007, pág. 86)


As brincadeiras em grupo criam oportunidades para o uso de métodos de educação afetiva. Outros autores salientam sobre a necessidade de orientar de maneira correta as manifestações emotivas da criança. Ivan Roberto Campelatto, psicólogo clínico e psicoterapeuta de crianças e adolescentes, coloca que:

Esse sujeito cuidador, em nome do afeto que sente pelo jovem, vai ajudá-lo a não destruir a própria fonte de amor, impedindo-o de agir em nome da raiva ou do medo. Deve-se permitir a manifestação do sentimento, porém impedir atos que aliviem apenas momentaneamente a dor do sentimento de desprazer. Pode-se sentir medo e/ou raiva; pode-se expressá-los através de choro ou palavras; só não se pode destruir a fonte de tais sentimentos, pois ela é também a fonte de seu prazer maior: o amor. (2002, pág. 09).


Outro ponto a ser levado em consideração é o problema da indisciplina, uma das grandes questões enfrentadas pelos professores em sala de aula. Naturalmente, uma abordagem correta no campo da afetividade tende a criar laços afetivos capazes de construir bons relacionamentos interpessoais. A construção de bons relacionamentos interpessoais tem um efeito positivo no controle da indisciplina, como pontua Parrat-Dayan (2008, p. 64): “[...] é mais eficaz se aproximar calmamente de um aluno e pedir para retomar seu trabalho que chamar a sua atenção em voz alta na frente de todos. [...]”. Evidencia-se com isso o papel preponderante do aspecto afetivo para uma boa condução do ambiente na sala de aula.
O fator emocional parece ser preponderante na questão da indisciplina. Nota-se que faz parte do desenvolvimento o processo em que as emoções transformam-se em racionalidade, entretanto, é sabido que há ocasiões em que as emoções tomam o lugar das interpretações racionais e são essas ocasiões que criam as oportunidades para a indisciplina. Wallon (2007, pág. 74) informa que: “É o efeito observado habitualmente no adulto: redução da emoção pelo controle ou pela simples tradução intelectual de seus motivos ou circunstâncias; perda de direção do raciocínio e das representações objetivas devido à emoção.”
Reforça-se, assim, a necessidade de uma abordagem correta no campo da afetividade[5], para que a criança aprenda a tomar decisões mais eficazes em relação ao que sente.


7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A educação é um processo que se efetua por iniciativa do educado. Todo o ser humano possui desde os seus primeiros anos de vida uma disposição para o aprendizado que é característico da espécie. Diante de um ambiente estimulante na família, na escola, na igreja, entre outros, a criança terá a possibilidade de desenvolver todas as suas capacidades.  Em contrapartida, em um ambiente que não atenda a esta característica natural da criança, outros valores vão tomando lugar até que este impulso amorteça.
Com o desenvolvimento de laços afetivos a criança irá construir seu conhecimento. É o sentimento que irá estimular a criança, por meio da imitação, a aumentar seu aprendizado.  Em suma: a criança imita a quem ama e aprende com a imitação. Amar é a chave do aprendizado. O amor de um indivíduo pelo mundo que o cerca será o combustível que irá fazer com que este indivíduo queira saber cada vez mais sobre como o objeto amado funciona.
Em sua relação afetiva com o mundo, toda a criança possui uma grande disposição para ao aprendizado. Nota-se, contudo, que tal disposição tende a diminuir na medida em que sofre influência de um ambiente pouco estimulante ao aprendizado: os pais que repetem ad nauseam a importância da educação, mas nada fazem na prática, a mídia que cria estereótipos negativos, a escola que na tentativa de se fazer entender oferece uma educação cada fez mais trivial, as políticas equivocadas que apresentam soluções paliativas, dentre outros fatores, são obstáculos a serem vencidos.
Se a criança não pode ser encarada como uma parte separada do todo, a escola também não pode ser vista somente como um meio de desenvolvimento profissional, mas antes como um treinamento para vida sendo a vida profissional um aspecto dela.



REFERÊNCIAS:


RIES, Bruno Edgar. Condicionamento Operante ou Instrumental: B.F. Skinner. In: LA ROSA, Jorge (org). Psicologia e Educação: o significado do aprender. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2003.

LA ROSA, Jorge. Psicologia e Educação: o significado do aprender. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2003

FERREIRA, Berta Weil. A aprendizagem na perspectiva humanista : Carl R. Rogers. In: LA ROSA, Jorge (org). Psicologia e Educação: o significado do aprender. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2003

GRATIOT-ALFANDÉRY, Hélène. Henri Wallon. Recife: Massangana, 2010.

WALLON, Henri. A evolução psicológica da criança. São Paulo: Fontes, 2007.

GOLEMAN, D. Inteligência Emocional. Lisboa: Temas e Debates, 1997

SYNDERS, Geoges. A alegria na escola. São Paulo: Manole, 1998.

RAACH, Leda. A Motivação do Aluno para a aprendizagem. Espírito Santo: UNIVEN, 1999.

DOWBOR, L. Educação, tecnologia e desenvolvimento. In: BRUNO, L. Educação e trabalho no capitalismo contemporâneo. São Paulo: Atlas, 1996.
SÁNCHEZ, Pilar; MARTINEZ Rabadán, VIVES, Marta; PENÃLVER, Iolanda. A psicomotricidade na educação infantil: uma prática preventiva e educativa. Porto Alegre: Artmed, 2003
.
BRASIL. MEC - Parâmetros curriculares nacionais - introdução aos parâmetros curriculares nacionais. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro01.pdf. Acessado em: 18/08/2015.
________. LDB, Lei 9.396, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm . Acessado em: 04/08/2015
MATOS PIVA, Janete Elisa de. Psicopedagogia e a influência da afetividade no processo ensino-aprendizagem. Rio Grande do Sul: REI, 2010.
                                       
VENTURA, Magda Maria. O estudo de caso como modalidade de pesquisa. Rio de Janeiro: SOCERRJ, 2007.
MOYSÉS, Gerson Luís Russo. MOORI, Roberto Giro. Coleta de dados para a pesquisa acadêmica: um estudo sobre a elaboração, a validação e a aplicação eletrônica de questionário. Paraná: ENEGEP, 2007.
OLIVEIRA, Almir Almeida de. Observação e entrevista em pesquisa qualitativa. Revista FACEVV.  Vila Velha, Número 4, Jan./Jun. 2010.
CEI - Centro de Educação Infantil Nosso Lar. Projeto político-pedagógico - PPP. Juína-MT, 2012.
SANTOS, Thais de Pádua. A Importância de Atividades Psicomotoras no Processo de Ensino e Aprendizagem. Revista Eletrônica Saberes da Educação – Volume 5 – nº 1 – 2014.

CAPELATTO, Ivan Roberto. Educação com afetividade. Campinas: EDUCAR: 2002.

PARRAT-DAYAN, Silvia. Como enfrentar a indisciplina na escola. São Paulo: Contexto, 2008.





[1] Definido pelo Prof Heitor Luiz Murat de Meirelles Quintella como uma “transformação da hipótese numa pergunta e que pode ser testada por meio de questões teste”.
[2] O aluno entra na sala de aula, derruba o caderno do colega que estava sobre a carteira, puxa o cabelo da menina logo a sua frente e grita com o colega que esbarrou nele sem querer. Em poucos minutos a sala de aula se transforma em uma panela de pressão pronta para explodir. Nem o professor está imune a este efeito.  Não se deixar levar pela emotividade do grupo requer firmeza, foco e estratégia para transformar toda essa energia em algo produtivo para todos.
[3] Outra característica da criança nesta fase é a falta de noção de tempo. Para a criança um período de privação ou de prazer, é um período interminável. Será que isso ajuda a explicar a falta de paciência de algumas crianças já crescidas?
[4] Os contos de fadas, além de estimular a imaginação, são excelentes transmissores de valores morais. Ótimos para trabalhar na questão da afetividade.
[5] Na ânsia de despertar o interesse pelo conhecimento as escolas se transformam em reféns das necessidades dos alunos. Enquanto as escolas se adaptam aos gostos de seus educandos, estes se transformam em pessoas incapazes de praticar a autodisciplina, o foco e a pro- atividade frente às dificuldades.