quinta-feira, 23 de junho de 2016

Evidências

Um dos principais argumentos ateístas contra a existência de Deus, digo “principais” não no sentido de “melhor”, mas antes, o de mais usado em debates, comentários e publicações diversas, seria aquele que aponta para a falta de evidências para Deus.

Para melhor compreender a discussão, talvez seja apropriada uma breve explanação do que se entende como “evidência”.  Uma evidência não é uma prova, mas sim uma pista de que algo que pode ou não ser verdadeiro.  Imagine o grande detetive fictício Sherlock Holmes, personagem criado por Arthur Conan Doyle, buscando evidências sobre um assassinato: um charuto encontrado no lugar do crime, pegadas deixadas no chão, um pedaço de tecido, etc. Tudo isso são evidências que podem levar Holmes ao verdadeiro assassino, mas não são provas.  Para conseguir uma prova precisamos seguir o caminho apontado pelas evidências. Ao final do caminho é que está a resposta. Se a resposta é falsa ou verdadeira, aplicaremos um teste para nos revelar. Se bem sucedido no teste, temos uma prova. Obviamente, é mais fácil escrever sobre isso, do que fazer.

Por definição, quando um ateu diz que “não há evidências para a existência de Deus”, o que ele esta dizendo na verdade, é que não há pistas sobre a existência de Deus.
 
Quando o ateu diz que não há provas sobre a existência de Deus o que ele está na verdade dizendo é que ele seguiu as pistas e chegou a uma resposta que, mediante a um teste, se provou verdadeira.  Rematando, é tolice levantar uma prova sem averiguar as evidências.  Pense o quanto ridículo seria, se o grande Sherlock Holmes, ao tentar provar a autoria de um crime não, apresentasse uma única evidência do fato.  Com certeza seus livros não teriam vendido tanto!

Imagine também o detetive que na incapacidade de levantar evidência, conclua a não existência do crime. “Sem evidências, não há crime”, poderia alguém dizer. Errado. Não se pode chegar um destino se não houver um caminho a ser percorrido. Não se pode chegar a uma resposta se não houver indicações suficientes que nos conduzam até elas. Sendo assim, a falta de evidências não pode ser usada como prova e nem como evidência. A grande verdade é que falta de evidências nada indica, nada revela, nada responde. Não leva a lugar algum. Ex nihilo nihil fit.


O ateu que usa a falta de evidência como prova da não existência de Deus, comete o mesmo erro do detetive que conclui que não existe crime porque não achou as evidências do mesmo. Ambos pegam o nada para dar resposta de alguma coisa. Não deve ser levada a sério, pessoa que tal absurdo afirma. Uma atitude muito mais inteligente neste caso seria se negar a dar opinião.

quarta-feira, 8 de junho de 2016

Educação Física

DARIDO, Suraya Cristina. Diferentes Concepções Sobre o Papel da Educação Física na Escola. São Paulo: UNIVESP, 2012


Suraya Cristina Darido é formada em Física pela Universidade de São Paulo e é doutora em Psicologia Escolar e desenvolvimento humano, também pela Universidade de São Paulo. É  coordenadora do Laboratório de estudos e trabalhos pedagógicos em Educação Física (LETPEF).
Em seu artigo intitulado Diferentes Concepções Sobre o Papel da Educação Física na Escola, a autora inicia se posicionando criticamente a respeito da forma como a Educação Física é vista na escola: como recompensa ou castigo para os alunos que demostram um determinado comportamento em outras disciplinas, o que, segundo a autora, tolhe a função educadora da atividade física na escola.
Esta visão errada sobre a Educação Física advém de uma concepção equivocada, que coloca a atividade intelectual à parte da atividade física, como se o ser humano fosse composto por “partes” diferentes, quando na verdade, a Educação Física caminha junto com as demais disciplinas na formação integral do individuo.
Ainda sobre a visão que é dispensada à disciplina de Educação Física nas escolas, a autora explica que a abordagem construtivista, com forte influência em Jean Piaget, é responsável por colocar a atividade física como uma auxiliadora para que os alunos possam ter um melhor desempenho nas outras matérias escolares. A despeito dos vários benefícios da abordagem construtivista, a autora coloca que ela reduz a importância da Educação Física, a colocando como uma ferramenta para melhorar o desempenho dos alunos nas disciplinas consideradas “mais importantes”.
É evidente que os jogos e brincadeiras ensinam. E, se ensinam, os jogos e brincadeiras praticados durante as aulas de Educação Física possuem um papel fundamental. Contudo, o que o aluno aprende com a atividade física não é algo “separado”, ou uma ferramenta para melhorar a atividade intelectual, mas sim, uma parte integrante do mesmo. Entender isso é importante para que as aulas de Educação físicas sejam corretamente planejadas, não incidindo do campo da mera recreação.
 A Psicomotricidade por oferecer uma formação mais integral, é uma abordagem mais articulada, segundo a autora. O desenvolvimento funcional e emocional do indivíduo está entre os principais benefícios do trabalho psicomotor. Percebe-se que esta abordagem possui diversas aplicações na área da educação e exige do professor de Educação Física uma posição mais pedagógica.
Além das contribuições relacionadas à formação intelectual e afetiva do indivíduo, existe na prática da Educação Física, obviamente, os benefícios em relação à saúde.  Entretanto, a autora problematiza o conceito de saúde classificando-o como “estreito” e levanta a questão das desigualdades sociais.
Naturalmente, uma maior qualidade de vida e um padrão mais elevado de saúde estão relacionados a uma melhor condição socioeconômica. Por isso, a autora conclui que é necessário repensar o entendimento de saúde, para que os menos privilegiados possam desfrutar dos benefícios que a Educação Física pode oferecer.


terça-feira, 7 de junho de 2016

Currículos

FRAGELLI, Patrícia Maria.  CARDOSO, Luciana Cristina. Escola e currículos 1. São Carlos: UFSCar, 2009.
Patrícia Maria Fragelli, professora de Escola e currículos da disciplina de Pedagogia da UAB-UFSCar é formada em pedagogia, mestre e doutora na área docente. Na primeira unidade da obra de sua autoria, é proposta uma análise sobre currículo, conhecimento e cultura.
Na relação entre escola e sociedade, de acordo com a autora, a escola faz parte de um contexto onde a sociedade lhe reflete os valores. Assim, o currículo escolar sempre deverá atender as necessidades da sociedade, o que promove discussões sobre quais conteúdos devem ser abordados e de quais maneiras. A autora também pondera que este conteúdo acadêmico deve primeiramente passar pela compreensão do professor, que tornará este conteúdo “ensinável”. Percebe-se, ainda, que o foco das discussões não mais se limita ao método, ou seja, ao modo usado para transmitir o conteúdo, uma vez que novas preocupações surgem, levantando questões como “o que ensinar” e para “quem ensinar”.
Por não considerar o currículo uma entidade separada do sistema educativo, a autora pondera a sua construção como algo que ocorre no decorrer das experiências humanas, não pode estar indissociável do ambiente escolar, pois muito mais do que simplesmente um roteiro para o trabalho do professor, o currículo é definido pelos os anseios, necessidades e expectativas da sociedade onde a escola está inserida.
Esta visão do currículo como a manifestação dos anseios, necessidades e expectativas da sociedade onde está inserida a escola, é necessária para afastar a ilusão de que ele, o currículo, é um ente abstrato. Para reforçar esta ideia, a autora propõe o estudo da história do currículo, pela qual poderemos verificar ser ele “um processo dinâmico, irregular e instável.” (2009, pg. 19).
A autora informa que após um período de negligência em relação ao currículo durante a década de 60, as atenções voltaram-se para as relações de poder, ao perceber-se como um grupo pode definir quais valores e conhecimentos deverão compor o currículo escolar. Neste momento, os conteúdos são mais estratificados e existe uma distinção maior entre “quem sabe” e quem “não sabe”. Esta tendência se modifica nas décadas posteriores, por meio de um processo de diminuição da estratificação e uma maior igualdade em relação àquilo que se sabe. Para a autora, tal tendência tem como obstáculo os interesses econômicos, políticos e mesmo educacionais de diversos grupos.
Ainda de acordo com a autora, a escola tende a reproduzir a forma com a sociedade se organiza, o que explica, por exemplo, a preferência por trabalhos de leitura e escrita que valorizam o indivíduo em detrimento aos trabalhos em grupo que priorizam o coletivo.
Como evidência da desigualdade social refletida no currículo escolar, a autora cita a diferença entre a educação de “alto status” das faculdades que valorizam o somente o currículo dos seus respectivos cursos, desprezando todo o conhecimento adquiro na família e em outros meios e o currículo de “baixo status”, que valoriza o conhecimento familiar e o trabalho em grupo.
Este tipo de divisão, segundo a autora, são resquícios do período da industrialização onde o currículo de um grupo tinha a função de preparar a mão de obra, enquanto que o de outro grupo visava à manutenção de privilégios. Assim, a autora ressalta a importância do estudo de currículos uma vez que ele possibilita a reflexão sobre as diferenças de um currículo que favorece a separação em classes e de um currículo que prioriza a igualdade.
A autora ainda coloca que na medida em que o currículo é constituído para atender uma necessidade imediata da sociedade, limitando-o, novas propostas surgem no esforço de diminuir as desigualdades, expandindo-o.
A autora continua a sua análise sobre a história do currículo explicando como nas décadas posteriores o Estado se encarrega de montá-lo o que aumenta a importância da Sociologia da Educação. Novos temas são acrescidos, como os ideais feministas e antirracistas, evidenciando os esforços por um currículo mais igualitário.
   
Comentário crítico
A escola que reflete as necessidades, valores e desejos da sociedade é um dos pontos mais interessantes da análise feita pela autora. Sendo o currículo escolar um produto da sociedade que define quais assuntos são importantes, os esforços para propor um currículo que não condiz com os valores da sociedade resultará em discrepância. Escola relevante é aquela que está em sintonia com o seu meio social. Quando se fala em crise na educação brasileira, na verdade, se fala em uma crise na sociedade brasileira. Por isso, qualquer projeto de currículo que vise sanar um problema social tende ao fracasso, pois a princípio, é a própria sociedade que define quais conteúdos são importantes.
Quando a autora coloca a questão do currículo “amplo e abrangente”, que promove a igualdade, em oposição àquele “fechado e limitado” que promove a desigualdade, ela está anunciando, na verdade, o fracasso do currículo escolar ao propor algo que está em desacordo com os desejos da sociedade. A tendência de qualquer pessoa que recebe algo que representa o oposto daquilo que ela quer, é rejeitar tal coisa. O resultado, é que a escola perde a sua relevância, seu significado na vida das pessoas. Transforma-se em um ente estranho.

Conclui-se, então, que educação não pode ser um processo que se restringe a escola. Somente uma sociedade saudável irá produzir valores saudáveis, para com eles influenciar o currículo escolar.