quinta-feira, 29 de setembro de 2011

O papel do cristianismo

Qual a função da religião? Responder a essa pergunta não é fácil.
Produto da mente humana, a religião é um conjunto de dogmas que normalmente se refere ao transcendente, à vida além do aspecto material.  Com “produto da mente humana”, não quero rebaixar as crenças religiosas, como fazem alguns críticos, ao nível da ilusão, como se o mundo transcendente não passasse de uma ficção reconfortante proveniente de uma mente amedrontada.
Hoje, com o advento da física quântica, o transcendente vem sido seriamente discutido nas áreas acadêmicas, ainda que os materialistas torçam o nariz para a idéia. Seriam nossas mentes provenientes de uma realidade além do mundo material?
Segundo a teoria da evolução, nossas crenças são apenas um conjunto de processos destinados a nos manter vivos. Nesse aspecto, do ponto de vista puramente adaptativo, não importa se essa crença é verdadeira ou não. O que essa crença deve fazer é promover uma reação que preserve a vida.
Se eu entrar numa caverna e me deparar com um urso, por exemplo, eu posso acreditar que ele é um animal feroz que vai me estraçalhar se eu não correr, ou acreditar que aquele animal é na verdade um velocista e que vai apostar uma corrida comigo. Ganha quem chegar primeiro ao topo daquela árvore.  Para a evolução, ambas as crenças são verdadeiras, pois ambas foram capazes de garantir a sobrevivência. Sendo assim, como podemos acreditar em nossas mentes, sendo elas resultadas de inúmeros processos evolutivos aleatórios, provenientes de formas de vida primitiva? Seriam nossas certezas ilusões? Nada é verdadeiro de fato?
Isso nos leva ao relativismo. O que é certo pra mim não é certo pra você. O que é verdade pra mim não é verdade pra você. Meus valores morais são ilusões, justificáveis tanto quanto à de um indiano do século XVIII ou um homo sapiens há cinco bilhões de anos. O homem é produto do seu tempo.
É certo que existam valores morais que são resultados de convenções sociais, contudo, também é evidente a existência de crenças e valores universais, que não estão sujeitas a essas convenções. Estuprar bebezinhos é errado independente das opiniões.  Não há dados que apóiem a idéia de que essa prática tenha sido unanimemente tolerada em algum passado remoto.
A função do cristianismo, assim como de outras religiões, é, do ponto de vista prático, a de traduzir esses valores universais, tornando-os acessíveis, sendo essa religião centrada em uma entidade como Deus ou não.
Não quero entrar na questão de ser necessária uma religião para um comportamento moral, pois esse assunto é por demais complexo e merece um texto apenas para tratar disso.
Quero me concentrar no papel que o cristianismo vem desempenhando na sociedade atual. Não o cristianismo espetáculo de nossos dias, nem o cristianismo ferramenta de épocas anteriores. Se é que se podem chamar essas práticas de cristianismo, pois o mesmo tem parâmetros que devem ser seguidos, sobre o risco de descaracterizá-lo.
 No sermão do monte (Mateus, Cap. 5 6 e 7). Jesus traduz para uma linguagem simples, vários preceitos morais de caráter universal. Em qualquer sociedade ou época é aceito que ser oprimido é uma coisa ruim, ser vítima de uma injustiça é uma coisa ruim e todos consideram coisas como honestidade e generosidade como coisas boas. Isso não depende de convenções sociais. A função do cristianismo, do ponto de vista prático, é fornecer preceitos morais às sociedades, que, através de mecanismos como o contrato social, por exemplo, seriam relativas.
Imagine uma sociedade que por meio de processos evolutivos, tenham desenvolvido uma moral totalmente diversa da nossa. Imagine que essa sociedade, invadindo nosso país, nos escravizasse. Sendo a crença deles puramente resultado de inúmeros processos adaptativos, cuja única função é garantir a sobrevivência da espécie, sem se preocupar se essa crença é verdadeira ou não, eles não têm como saber se o que estão fazendo é realmente certo. E o mesmo pode ser dito de nós. Nós não teremos argumentos para legitimar nosso desejo de ser livres, pois nossas crenças também são frutos de processos puramente evolutivos e não uma verdade que possa ser classificada como verdadeira de fato. Assim, tudo se torna relativo. Nosso contrato social é totalmente diferente do contrato deles.
Como é possível que algo assim aconteça, sem algum tipo de protesto? Porque de fato, existem valores morais absolutos que não dependem das opiniões de cada sociedade. Esse caráter universal da moral é ensinado por diversas religiões espalhadas pelo globo.
No cristianismo, Jesus sintetizou tudo isso em uma única frase: “Ama ao teu próximo, como a ti mesmo”. (Mateus, 32: 35- 38)

Nenhum comentário:

Postar um comentário