FRAGELLI, Patrícia Maria. CARDOSO, Luciana Cristina. Escola e currículos 1. São Carlos:
UFSCar, 2009.
Patrícia Maria
Fragelli, professora de Escola e currículos da disciplina de Pedagogia da
UAB-UFSCar é formada em pedagogia, mestre e doutora na área docente. Na
primeira unidade da obra de sua autoria, é proposta uma análise sobre
currículo, conhecimento e cultura.
Na relação entre
escola e sociedade, de acordo com a autora, a escola faz parte de um contexto
onde a sociedade lhe reflete os valores. Assim, o currículo escolar sempre
deverá atender as necessidades da sociedade, o que promove discussões sobre
quais conteúdos devem ser abordados e de quais maneiras. A autora também
pondera que este conteúdo acadêmico deve primeiramente passar pela compreensão
do professor, que tornará este conteúdo “ensinável”. Percebe-se, ainda, que o
foco das discussões não mais se limita ao método, ou seja, ao modo usado para
transmitir o conteúdo, uma vez que novas preocupações surgem, levantando
questões como “o que ensinar” e para “quem ensinar”.
Por não considerar o
currículo uma entidade separada do sistema educativo, a autora pondera a sua
construção como algo que ocorre no decorrer das experiências humanas, não pode
estar indissociável do ambiente escolar, pois muito mais do que simplesmente um
roteiro para o trabalho do professor, o currículo é definido pelos os anseios,
necessidades e expectativas da sociedade onde a escola está inserida.
Esta visão do
currículo como a manifestação dos anseios, necessidades e expectativas da
sociedade onde está inserida a escola, é necessária para afastar a ilusão de
que ele, o currículo, é um ente abstrato. Para reforçar esta ideia, a autora
propõe o estudo da história do currículo, pela qual poderemos verificar ser ele
“um processo dinâmico, irregular e instável.” (2009, pg. 19).
A autora informa que
após um período de negligência em relação ao currículo durante a década de 60,
as atenções voltaram-se para as relações de poder, ao perceber-se como um grupo
pode definir quais valores e conhecimentos deverão compor o currículo escolar.
Neste momento, os conteúdos são mais estratificados e existe uma distinção
maior entre “quem sabe” e quem “não sabe”. Esta tendência se modifica nas
décadas posteriores, por meio de um processo de diminuição da estratificação e
uma maior igualdade em relação àquilo que se sabe. Para a autora, tal tendência
tem como obstáculo os interesses econômicos, políticos e mesmo educacionais de
diversos grupos.
Ainda de acordo com a
autora, a escola tende a reproduzir a forma com a sociedade se organiza, o que
explica, por exemplo, a preferência por trabalhos de leitura e escrita que
valorizam o indivíduo em detrimento aos trabalhos em grupo que priorizam o
coletivo.
Como evidência da
desigualdade social refletida no currículo escolar, a autora cita a diferença
entre a educação de “alto status” das faculdades que valorizam o somente o
currículo dos seus respectivos cursos, desprezando todo o conhecimento adquiro
na família e em outros meios e o currículo de “baixo status”, que valoriza o
conhecimento familiar e o trabalho em grupo.
Este tipo de divisão,
segundo a autora, são resquícios do período da industrialização onde o
currículo de um grupo tinha a função de preparar a mão de obra, enquanto que o
de outro grupo visava à manutenção de privilégios. Assim, a autora ressalta a
importância do estudo de currículos uma vez que ele possibilita a reflexão
sobre as diferenças de um currículo que favorece a separação em classes e de um
currículo que prioriza a igualdade.
A autora ainda coloca
que na medida em que o currículo é constituído para atender uma necessidade
imediata da sociedade, limitando-o, novas propostas surgem no esforço de diminuir
as desigualdades, expandindo-o.
A autora continua a
sua análise sobre a história do currículo explicando como nas décadas
posteriores o Estado se encarrega de montá-lo o que aumenta a importância da
Sociologia da Educação. Novos temas são acrescidos, como os ideais feministas e
antirracistas, evidenciando os esforços por um currículo mais igualitário.
Comentário
crítico
A escola que reflete
as necessidades, valores e desejos da sociedade é um dos pontos mais
interessantes da análise feita pela autora. Sendo o currículo escolar um
produto da sociedade que define quais assuntos são importantes, os esforços
para propor um currículo que não condiz com os valores da sociedade resultará
em discrepância. Escola relevante é aquela que está em sintonia com o seu meio
social. Quando se fala em crise na educação brasileira, na verdade, se fala em
uma crise na sociedade brasileira. Por isso, qualquer projeto de currículo que
vise sanar um problema social tende ao fracasso, pois a princípio, é a própria
sociedade que define quais conteúdos são importantes.
Quando a autora
coloca a questão do currículo “amplo e abrangente”, que promove a igualdade, em
oposição àquele “fechado e limitado” que promove a desigualdade, ela está
anunciando, na verdade, o fracasso do currículo escolar ao propor algo que está
em desacordo com os desejos da sociedade. A tendência de qualquer pessoa que
recebe algo que representa o oposto daquilo que ela quer, é rejeitar tal coisa.
O resultado, é que a escola perde a sua relevância, seu significado na vida das
pessoas. Transforma-se em um ente estranho.
Conclui-se, então,
que educação não pode ser um processo que se restringe a escola. Somente uma
sociedade saudável irá produzir valores saudáveis, para com eles influenciar o
currículo escolar.
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