terça-feira, 7 de junho de 2016

Currículos

FRAGELLI, Patrícia Maria.  CARDOSO, Luciana Cristina. Escola e currículos 1. São Carlos: UFSCar, 2009.
Patrícia Maria Fragelli, professora de Escola e currículos da disciplina de Pedagogia da UAB-UFSCar é formada em pedagogia, mestre e doutora na área docente. Na primeira unidade da obra de sua autoria, é proposta uma análise sobre currículo, conhecimento e cultura.
Na relação entre escola e sociedade, de acordo com a autora, a escola faz parte de um contexto onde a sociedade lhe reflete os valores. Assim, o currículo escolar sempre deverá atender as necessidades da sociedade, o que promove discussões sobre quais conteúdos devem ser abordados e de quais maneiras. A autora também pondera que este conteúdo acadêmico deve primeiramente passar pela compreensão do professor, que tornará este conteúdo “ensinável”. Percebe-se, ainda, que o foco das discussões não mais se limita ao método, ou seja, ao modo usado para transmitir o conteúdo, uma vez que novas preocupações surgem, levantando questões como “o que ensinar” e para “quem ensinar”.
Por não considerar o currículo uma entidade separada do sistema educativo, a autora pondera a sua construção como algo que ocorre no decorrer das experiências humanas, não pode estar indissociável do ambiente escolar, pois muito mais do que simplesmente um roteiro para o trabalho do professor, o currículo é definido pelos os anseios, necessidades e expectativas da sociedade onde a escola está inserida.
Esta visão do currículo como a manifestação dos anseios, necessidades e expectativas da sociedade onde está inserida a escola, é necessária para afastar a ilusão de que ele, o currículo, é um ente abstrato. Para reforçar esta ideia, a autora propõe o estudo da história do currículo, pela qual poderemos verificar ser ele “um processo dinâmico, irregular e instável.” (2009, pg. 19).
A autora informa que após um período de negligência em relação ao currículo durante a década de 60, as atenções voltaram-se para as relações de poder, ao perceber-se como um grupo pode definir quais valores e conhecimentos deverão compor o currículo escolar. Neste momento, os conteúdos são mais estratificados e existe uma distinção maior entre “quem sabe” e quem “não sabe”. Esta tendência se modifica nas décadas posteriores, por meio de um processo de diminuição da estratificação e uma maior igualdade em relação àquilo que se sabe. Para a autora, tal tendência tem como obstáculo os interesses econômicos, políticos e mesmo educacionais de diversos grupos.
Ainda de acordo com a autora, a escola tende a reproduzir a forma com a sociedade se organiza, o que explica, por exemplo, a preferência por trabalhos de leitura e escrita que valorizam o indivíduo em detrimento aos trabalhos em grupo que priorizam o coletivo.
Como evidência da desigualdade social refletida no currículo escolar, a autora cita a diferença entre a educação de “alto status” das faculdades que valorizam o somente o currículo dos seus respectivos cursos, desprezando todo o conhecimento adquiro na família e em outros meios e o currículo de “baixo status”, que valoriza o conhecimento familiar e o trabalho em grupo.
Este tipo de divisão, segundo a autora, são resquícios do período da industrialização onde o currículo de um grupo tinha a função de preparar a mão de obra, enquanto que o de outro grupo visava à manutenção de privilégios. Assim, a autora ressalta a importância do estudo de currículos uma vez que ele possibilita a reflexão sobre as diferenças de um currículo que favorece a separação em classes e de um currículo que prioriza a igualdade.
A autora ainda coloca que na medida em que o currículo é constituído para atender uma necessidade imediata da sociedade, limitando-o, novas propostas surgem no esforço de diminuir as desigualdades, expandindo-o.
A autora continua a sua análise sobre a história do currículo explicando como nas décadas posteriores o Estado se encarrega de montá-lo o que aumenta a importância da Sociologia da Educação. Novos temas são acrescidos, como os ideais feministas e antirracistas, evidenciando os esforços por um currículo mais igualitário.
   
Comentário crítico
A escola que reflete as necessidades, valores e desejos da sociedade é um dos pontos mais interessantes da análise feita pela autora. Sendo o currículo escolar um produto da sociedade que define quais assuntos são importantes, os esforços para propor um currículo que não condiz com os valores da sociedade resultará em discrepância. Escola relevante é aquela que está em sintonia com o seu meio social. Quando se fala em crise na educação brasileira, na verdade, se fala em uma crise na sociedade brasileira. Por isso, qualquer projeto de currículo que vise sanar um problema social tende ao fracasso, pois a princípio, é a própria sociedade que define quais conteúdos são importantes.
Quando a autora coloca a questão do currículo “amplo e abrangente”, que promove a igualdade, em oposição àquele “fechado e limitado” que promove a desigualdade, ela está anunciando, na verdade, o fracasso do currículo escolar ao propor algo que está em desacordo com os desejos da sociedade. A tendência de qualquer pessoa que recebe algo que representa o oposto daquilo que ela quer, é rejeitar tal coisa. O resultado, é que a escola perde a sua relevância, seu significado na vida das pessoas. Transforma-se em um ente estranho.

Conclui-se, então, que educação não pode ser um processo que se restringe a escola. Somente uma sociedade saudável irá produzir valores saudáveis, para com eles influenciar o currículo escolar.

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